Incapaz de resolver conflitos, brasileiro alimenta cultura do processo

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O Brasil é uma República paradoxal. Tem o maior número de faculdades de Direito de todo o planeta. Não só isso: tem mais faculdades de Direito do que a soma de todas as demais existentes no restante do globo. Será por isso a nação mais justa sobre a face da Terra?
Não existe consenso a respeito. O que se constata é a proliferação de carreiras jurídicas e a consequente “judicialização da vida brasileira”. O que significa? Todo e qualquer problema, toda e qualquer questão, chega a um juiz ou a um tribunal. Com certeza a ambos.
O “sistema Justiça” é complexo e sofisticado. Existem cinco “Justiças”, duas comuns: uma estadual, outra federal; e três especiais: trabalhista, militar e eleitoral. Integram esse sistema o Ministério Público, a Defensoria Pública, a advocacia, as polícias civil e militar, o sistema prisional e as estruturas funcionais de todos esses estamentos.
Para que um processo chegue ao fim, ele pode, e geralmente isso acontece, percorrer quatro instâncias ou graus de jurisdição. Começa com o juiz singular, depois passa por um tribunal e pode chegar a uma terceira instância.
No caso da Justiça comum, chega ao Superior Tribunal de Justiça e, finalmente, ao Supremo Tribunal Federal. Sabe-se, portanto, quando começa um processo, mas não podemos nunca assegurar quando ele terminará.
Para complicar esse quadro, o processo – ciência que estuda o instrumento de realização do justo concreto – converteu-se em finalidade em si, e muito mais importante do que o direito substancial. Por isso é que, ciência sofisticada, o processo gera inúmeras respostas a uma pretensão posta em juízo, todas elas periféricas, epidérmicas, sem exame do mérito.
Ou seja: o processo termina e o conflito continua, com certeza mais agravado ante a decepção de quem acreditou numa solução ditada pelo Judiciário. Essa é a situação presente. A sociedade demandista se submete à cultura do litígio.
São 100 milhões de processos para 202 milhões de pessoas. Transmite-se à sociedade global a nítida impressão de que o Brasil é o país mais beligerante desse sofrido planeta.
Impõe-se a quem tiver discernimento hábil a vislumbrar a gravidade da situação, e repensar com urgência o “sistema Justiça”. É urgente disseminar uma cultura de pacificação, de conciliação, de mediação, de arbitragem ou de qualquer uma das dezenas de estratégias já adotadas pelo direito anglo-saxão, para que o equipamento atinja a funcionalidade esperada.
Além disso, é imperativo adotar práticas de gestão mais racionais, que confiram ao “sistema Justiça” o atributo da eficiência. Toda administração pública se submete aos princípios da legalidade, da publicidade, da impessoalidade, da moralidade e da eficiência. O povo não pode gastar dinheiro sem os serviços de qualidade aos quais tem direito.
Outra medida inadiável é a substanciosa mudança do ensino jurídico, ainda anacrônico e superado, de tendência evidentemente adversarial, para um novo padrão de profissional do direito. Alguém que, antes de entrar em juízo como alternativa única diante de um interesse lesado, promova a dialógica entabulação de um possível e provável acerto de contas entre partes potencialmente adversárias.
Sem prejuízo da reflexão mais importante dessas observações, o que está em jogo não é o atravancamento do Judiciário, nem a intenção de aliviá-lo de uma carga insuportável de trabalho. O que se põe como inafastável é acordar a cidadania para o princípio da subsidiariedade, para o protagonismo hábil a tornar as pessoas maduras, sensatas e capazes de implementar a prometida democracia participativa, da Constituição de 1988.
Sem isso, continuaremos a nutrir o paradigma de uma população infantilizada, puerilizada, dependente do Estado-babá que, a par de propiciar todo o tipo de bolsas assistenciais, a ela assegura a “Bolsa-Justiça” e, com isso, a impede de crescer e de exercer em plenitude os seus direitos.
José Renato Nalini
Fonte: Uol – 19/02/2015 – 06h00
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19 de outubro de 2015 |

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