MP 752/16: mais segurança jurídica para arbitragens no mundo público

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A medida provisória 752, de 24.11.2016, regulamentou a prorrogação antecipada e a relicitação de contratos de parceria nos setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário. Seu objetivo primordial é viabilizar novos e imediatos investimentos em projetos de infraestrutura e solucionar entraves ligados à execução de certos contratos de concessão.
Apesar de o foco da MP estar na modificação de contratos vigentes, outros temas, mais amplos e igualmente relevantes, também entraram no seu radar. A viabilidade jurídica da resolução de conflitos envolvendo o poder público por meio de arbitragem é um deles.
A tendência legislativa, acompanhada pela própria prática da administração pública quando da celebração de contratos, tem sido a de prever a arbitragem como mecanismo hábil a solucionar disputas. No entanto, mesmo sem a legislação conter qualquer restrição específica, parcela dos intérpretes e aplicadores do Direito tem considerado que entidades estatais não podem participar de procedimentos arbitrais. A origem desse posicionamento está na ideia de que, em decorrência do princípio da indisponibilidade do interesse público, interesses tutelados pela administração não se coadunariam, em absoluto, com esse sistema de jurisdição não estatal.
O raciocínio é o de que, tendo a Lei de Arbitragem, de 1996, restringido arbitragens a causas que envolvam “direitos disponíveis” (art. 1º), todo litígio ligado à administração (direta e indireta) necessariamente teria que ser decidido por jurisdição estatal (Judiciário). Pelo princípio geral de direito administrativo da indisponibilidade do interesse público pelo administrador, todo e qualquer direito titularizado por ente da administração necessariamente seria indisponível e, por isso, insuscetível de ser discutido em procedimento arbitral.
Em 2015, alteração na Lei de Arbitragem cravou que a administração pública, direta e indireta, pode se valer de arbitragem para dirimir conflitos (art. 1º, § 1º). Problema resolvido? Longe disso. É que o diploma acresceu à regra a necessidade de litígios envolverem direitos patrimoniais disponíveis, eximindo-se, contudo, de dizer o que se deveria entender como tal.
A afirmação forte da lei (“a administração (…) poderá utilizar-se de arbitragem”) na prática acabou tendo seus efeitos mitigados por conta da reintrodução de dúvida antiga ao debate: afinal, quais direitos patrimoniais da administração pública efetivamente seriam disponíveis?
A MP 752/16 pela primeira vez enfrentou o desafio de especificar, no plano legal, rol de direitos patrimoniais da administração passíveis de serem levados a discussão em arbitragem. De acordo com o diploma, são direitos patrimoniais disponíveis “questões relacionadas à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos”; o “cálculo de indenizações decorrentes de extinção ou de transferência do contrato de concessão”; e o “inadimplemento de obrigações contratuais por qualquer das partes” (art. 25, § 4º). O dispositivo é aplicável apenas a contratos de parceria nos setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário
De um lado, a MP contrapôs-se a interpretações restritivas de órgãos de controle, em especial do Tribunal de Contas da União. O TCU, por exemplo, já negou o uso de arbitragem para a discussão de aspectos econômico-financeiros de contratos de concessão (acórdão 2.573/2012). Por outro lado, a MP transformou em regra geral entendimentos incidentais desses mesmos órgãos de controle. No acórdão TCU 2.905/2014, por exemplo, o Tribunal indicou ser possível o uso de arbitragens para calcular eventual indenização devida em função da extinção de contratos.
A fórmula aberta da Lei de Arbitragem (original e atual) acabou estimulando interpretações restritivas sobre o significado e conteúdo jurídico da expressão “direitos patrimoniais disponíveis”. O estabelecimento de rol de direitos da administração possíveis de serem levados a jurisdição não estatal tende a trazer mais segurança jurídica à arbitragem no mundo público. Seria positivo que o Congresso Nacional chancelasse essa específica iniciativa da MP.
Por André Rosilho, mestre em Direito pela FGV Direito SP. Doutorando em Direito pela USP. Coordenador do Curso de Direito Público da SBDP/FGV Direito SP. Advogado.
Fonte: Direito do Estado – 19/12/2016
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19 de dezembro de 2016 |

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